Em todos os tempos, queiramos ou não, a Morte sempre esteve envolvida no mistério impregnado de divino.
Os epitáfios romanos, mesmo os mais
simples, são deveras sintomáticos a esse respeito – e o que encontramos
Consagra-se a sepultura aos deuses
Manes, protectores da pessoa no Além – também porque tal consagração confere ao
sepulcro uma sacralidade, que é sacrilégio violar.
Vem o nome do defunto e também os
dos que tiveram a iniciativa de lhe erigir o túmulo – mui provavelmente, lá
irão também repousar. Uma forma de salvar o nome do esquecimento!
Hic
situs est, «aqui jaz», no presente do indicativo, com tantos anos de
idade!... Como se ali eternamente permanecesse, com a idade com que faleceu.
«Que a terra te seja leve!». Sim, na
segunda pessoa: ao lermos o epitáfio, falamos com o defunto. Ele está connosco!
Dos monumentos funerários de Conímbriga há um, datável dos anos 130,
que merece reflexão especial, dado o seu amplo significado cultural: é a cupa do
liberto imperial Públio Élio Januário, falecido aos 40 anos. O epitáfio foi
mandado lavrar, a expensas suas, pela esposa, Tibéria Cláudia Cale, «ao marido
óptimo» e pelo filho, Públio Élio Efésio, «ao pai modelo de piedade».
Em primeiro lugar, assinale-se que a
tipologia do monumento (veja-se a fotografia, da autoria de Humberto
Rendeiro, pertencente ao Arquivo do MMC-MN/DGPC, gentil cedência que muito agradeço)
se prende com a tradi
Essa relevância social reflecte-se também
não apenas no facto de a família ter acompanhado Januário mas também no modo
como sua mulher se identifica, com três nomes, circunstância assaz rara e que
se justifica aqui por descender de uma família de libertos de um Tibério Cláudio,
o imperador Tibério ou o imperador Cláudio.
Um terceiro
aspecto: terá Januário falecido mesmo com 40 anos? Sabendo nós como esse número
detém – em todas as civilizações – um carácter simbólico, de número perfeito
(veja-se http://hdl.handle.net/10316/25565), não quererá Calé explicitar assim que seu
marido viveu
Exemplo acabado, portanto, de como o
epitáfio – neste caso, também por mencionar os deuses Manes – reflecte o modo como
os Romanos encaravam a morte, revestindo-a dum halo místico, é certo, mas
conotando-a igualmente com uma continuidade de vida: recordando o que o defunto
foi, mantemos viva a sua memória; comungamos na dor e reconfortamo-nos na
permanência…
José d’Encarnação
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